Os brasileiros superaram os quenianos neste sábado (dia 29) na estréia do Desafio da Mata Atlântica A Tribuna/ Cubatão, corrida classificada como a mais difícil do Brasil, com 7,5 km só de subida no Caminho do Mar (Estrada Velha), uma área de total preservação ambiental e patrimônio histórico.
As vitórias ficaram com dois goianos. Entre os homens, David Andrade de Mesquita, do Cruzeiro EC, surpreendeu para faturar a sua primeira vitória de destaque na carreira, enquanto que entre as mulheres, Marizete de Paula Rezende (Dahma/ CTA Araraquara) confirmou o favoritismo, com uma larga vantagem sobre as rivais. Como prêmios, receberam, cada um, R$ 3,5 mil de um total de R$ 30 mil distribuídos aos 10 melhores do masculino e feminino.
A competição reuniu 1.000 atletas, entre corredores e caminhantes, que enfrentaram uma dura subida, com largada ao nível do mar e chegada a 720 metros de altitude. Além da ascensão de 100 metros a cada quilômetro, com trechos íngremes, os competidores enfrentaram frio, chuva e muita neblina.
O visual compensou o esforço, com vegetação nativa da Mata Atlântica como cenário em todo o trajeto. Após a disputa, os competidores foram unânimes em classificar a disputa como a mais dura feita no País e também elogiaram a inovação e organização do evento.
“Essa é uma prova de superação total. É única, emocionante, pela dificuldade, pelo local lindo. É uma corrida bem típica nossa, que somos meio malucos”, comentou Marizete Rezende, que é de Goiânia e atualmente mora em Araraquara, no interior de SP. Sua vitória foi, de certa forma, tranquila. Logo após um KM 1, partiu sozinha na frente, abrindo cada vez mais vantagem.
As duas principais rivais, a queniana Anne Bererwe (Fila) e a santista Sirlene Souza de Pinho (Memorial/ Mizuno), não conseguiram acompanhar suas passadas. Ela cruzou a linha de chegada, muito emocionada, em 36 minutos e 29 segundos, mais de dois minutos à frente da queniana, com 38min41s. Sirlene foi a 3ª colocada, com 39min14s.
“Mantive a mesma velocidade do começo ao fim. Numa prova dura como essa não adianta fazer o fartek (alternar velocidade), a não ser quando vem alguém junto”, comentou. “Hoje não veio ninguém, graças a Deus”, brincou a campeã, que só teve como rival a sua dificuldade na respiração, consequência de uma rinite crônica, que a impede de respirar pelo nariz quando faz esforço.
“Tive de puxar mais ar pela boca e tive muita dor no baço”, contou Marizete, considerada uma das atletas mais premiadas nas corridas no País. Só este ano, chegou a incrível marca de 15 vitórias, além do vice na Maratona de São Paulo. Aos 31 anos, ela começou a se dedicar totalmente ao atletismo aos 23 - corrida desde os 20. Antes, exerceu as mais variadas atividades, como vender banana na rua e telefonista em escritório de contabilidade.
A vice-campeã, Anne Bererwe, elogiou a vencedora e, ao mesmo tempo, deixou um ar de revanche para 2007. “Ela é muito forte, mas nem tanto. Quero voltar aqui e vencer”, ressaltou a atleta de 23 anos. Sirlene ficou feliz com o resultado, dadas às circunstâncias na prova.
Seu joelho direito inchou durante a subida, causando dor. “Bem de fôlego eu estava, mas fisicamente fiquei prejudicada. Tentei acompanhar a Marizete até o KM 2 e a dor foi mais forte”, falou Sirlene, 30 anos, uma ex-faxineira, que hoje vive exclusivamente do atletismo e figura entre as principais do Brasil.
SURPRESA - Chegando sem alarde, David Mesquita pegou todos de surpresa ao imprimir um ritmo forte, cadenciado desde o início. O pelotão de elite foi diminuindo conforme a subida e já no km 2 David e Elijah Yator começaram a se distanciar. O queniano vinha forte, mas no km 4, teve uma queda de rendimento, ficando cerca de 10 segundos atrás.
Dali em diante, o campeão foi apenas controlando o forte oponente, que já venceu uma prova de 22 km de subida na França. Venceu com 31min35s, uma vantagem de 12 segundos sobre Yator. O mineiro Lindomar Modesto de Oliveira, o Pantanal, também do Cruzeiro e apontado como um dos cotados, chegou na 3ª colocação, com 31min56s.
Ex-jogador de futebol, David começou a correr somente aos 25 anos, enfrentou sérias lesões, ficou parado por dois anos e retornou aos 30. Agora, aos 34 anos, começa a deslanchar na carreira. Este ano, foi o vice-campeão da Volta ao Cristo, uma corrida que tem 3,5 km de subida, o que o animou a enfrentar o Desafio da Mata Atlântica A Tribuna/ Cubatão.
“Fiquei um mês me preparando exclusivamente para esta prova só em morros e na academia”, revelou o corredor de Aparecida de Goiânia no interior de Goiás. Segundo ele, a prova foi muito dura, mas o frio amenizou o desgaste físico. “Gosto de correr em temperatura baixa. Corri no mesmo ritmo o tempo todo e depois do KM 6 vi que ia ganhar”, contou David.
Elijah Yator foi outro que elogiou a nova prova. “Gostei muito. É dura e num lugar bonito. No próximo ano, volto mais preparado ainda”, ressaltou o atleta de 23 anos. Já Lindomar Pantanal lamentou o mal-estar que teve ao acordar, o que prejudicou seu desempenho sensivelmente.
“Eu nem iria correr. Passei mal e vomitei todo o café da manhã, mas como gosto de correr em subidas não quis ficar fora e ainda cheguei em 3º lugar, que foi ótimo”, argumentou. “Essa é uma prova que veio para ficar, bem organizada. É chique”, afirmou o sempre bem humorado Pantanal.
O coordenador do Departamento Técnico de Corridas de Rua da Federação Paulista de Atletismo, Cristiano Barbosa, fez questão de destacar que a prova é, tecnicamente, a mais difícil do Brasil. “Foi um evento muito bom e com um nível excelente”, frisou o representante da Federação.
Apesar da dificuldade, os amadores completaram bem o trajeto, inclusive os caminhantes. Amigas de caminhada, em Santos, Maria Rosa de Amorim, 78 anos (mais idosa do evento), Reiko Konno, 77, e Fusae Nishida Uramoto, 75, estavam entre as alegres atletas que cumpriram o Desafio, fazendo muita festa na chegada. “Foi ótimo, maravilhoso”, comentou Reiko.
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